Os trabalhos de tradução da Bíblia King James de 1611

Em janeiro de 1604, o rei James convocou a Conferência da Corte de Hampton a fim de ouvir “o que poderia estar errado com o desenvolvimento da igreja”. Durante a conferência, o líder puritano Dr. John Reynolds, solicitou ao rei James que a melhor maneira de se cooperar para o progresso da vida e da doutrina da Igreja seria dar ao povo uma nova e mais correta tradução das Escrituras, corrigindo uma série de pontos alterados e corrompidos nas Bíblias permitidas nos reinados de Henrique VIII e Eduardo VI.

O rei James se agradou muito da ideia e em julho de 1604 nomeou 54 homens que formaram um comitê de tradução. Esses homens não eram apenas os melhores linguistas e maiores eruditos do seu reino, mas considerados, na época, os mais capazes do mundo. Muito do trabalho e da metodologia desses homens, aplicados à tradução da Bíblia King James, formou a base dos mais importantes estudos linguísticos e tradutológicos, ainda hoje, usados nas grandes universidades em todo o mundo.

Os estudiosos e tradutores foram organizados e divididos em seis grupos, e se encontravam respectivamente em Westminster, Cambridge e Oxford (curiosamente, a ideia da tradução da Bíblia King James Atualizada em português também surgiu em Oxford durante uma série de palestras sobre o assunto sob a coordenação da Lion Publishing com a participação do editor e jornalista Oswaldo Paião, representando a Sociedade Bíblica Ibero-Americana do Brasil e a editora Abba Press). Esse grupo de eruditos reuniam qualificações gerais e específicas cujo conhecimento e habilidade com as línguas originais jamais foram rivalizados por quaisquer outros especialistas, quer antes ou depois deles, até o dia de hoje. Foram estudiosos que dedicaram toda a vida na sincera busca de Deus e do conhecimento da Sua Palavra. Um desses tradutores foi o Dr. Lancelot Andrews, que dominava pelo menos 15 línguas, e, com cerca de seis anos, já havia lido toda a Bíblia Hebraica (Tanakh). Todos os demais membros do comitê de tradução liderados pelo próprio rei e biblista James I, tinham semelhante qualificação. Alguns foram autores dos mais importantes dicionários e léxicos, inclusive em línguas estrangeiras; era comum realizarem extensos e profundos debates em grego; todos foram autores de grandes obras em outras áreas do conhecimento. Eles não somente conheciam perfeitamente a língua e a cultura hebraica, aramaica e grega, mas dominavam outros idiomas relacionados ao mundo antigo e bíblico que, sem dúvida, iluminavam o conhecimento geral, como o arábico, persa, cóptico, siríaco, latim, caldeu, espanhol, francês, italiano e holandês.

Esses valorosos homens não foram somente alguns dos mais respeitáveis eruditos do mundo em sua época, foram igualmente cristãos comprometidos com uma vida sincera e dedicados à fé em Jesus Cristo e na Palavra de Deus. Serviram ao Senhor como deões e presidentes das mais renomadas universidades da terra, como Oxford, Cambridge e Westminster. Alguns deles ficaram conhecidos por seus longos períodos de oração de até cinco horas por dia, fora o trabalho diuturno que realizavam.

Contudo, todo o trabalho de tradução da Bíblia King James (Authorized Version, como era seu nome original) não foi realizado sem grande oposição de muitos desafetos e inimigos da verdade. De acordo com as notas dos tradutores que ficaram registradas no prefácio da Bíblia King James, a igreja Católica Romana fez oposição radical e até mortal contra cada participante  da versão e publicação dessa edição da Bíblia em língua comum. O sistema papal constituiu-se num dos mais ferrenhos inimigos dos tradutores. O comitê de tradução escreveu à alta cúpula da instituição Católico Romana: “Nossos críticos têm tanto medo da Luz das Escrituras, que eles desconfiam até daqueles que por essa Luz são iluminados… Certamente não somos daqueles que tendo encontrado o bom e puro ouro ficam receosos de prová-lo ao fogo, mas tememos sim, a falsidade.”

Ao lermos o comentário “Dos Tradutores ao Leitor” e “A Carta Dedicatória”, que se encontram na primeira edição da “Authorized Version” (Versão Autorizada), compreendemos que o próprio rei James I posicionou-se como uma parede, um baluarte, contra todas as tentativas para neutralizar ou retardar essa obra. Eis um trecho do depoimento que abre o comentário “Dos Tradutores ao Leitor” publicado na primeira edição da Bíblia King James em 1611:

“A coragem e constância de Sua Majestade, apesar das muitas e ferozes calúnias que sofrera, possibilitou que as mais acuradas pesquisas em benefício da tradução das línguas bíblicas originais para o Inglês tivessem pleno êxito”.

Apesar da forte oposição da instituição católico romana, a grandiosa obra de tradução da Bíblia King James foi completada com louvores em 1611 e passou a ser conhecida como a primeira “Authorized Version of the Bible” – a primeira tradução dos manuscritos da Bíblia, a partir dos textos bíblicos nas línguas originais, disponíveis ao estudo na época, para a língua comum inglesa, mediante expressa autorização do rei – como havia profetizado Tyndale há muitos anos, pouco antes de ser degolado e queimado em praça pública, na cidade de Vilvoorden (próximo de Bruxelas, Bélgica) em 1536, por ordem do rei Henrique VII em conluio com as igrejas Anglicana e Católico Romana. William Tyndale foi um pastor e estudioso protestante inglês, mestre em artes em Oxford, o primeiro tradutor das Escrituras para a língua inglesa, que fora condenado à morte em fogueira pública pelo crime de traduzir e publicar as Escrituras Sagradas em linguagem popular (comum) e que, no momento de sua execução, bradara diante de seus algozes e do povo: “Meu Deus, abra os olhos do rei da Inglaterra!”. E, 75 anos depois, essa súplica cumpriu-se integralmente com a publicação da “Authorized Version”, a Bíblia King James.

Nos anos que seguiram ao seu lançamento público, a Bíblia King James eclipsou todas as demais traduções e versões até então produzidas em todo o mundo – jamais por força ou poder político, mas pela própria vontade e expressão dos estudiosos e do povo leitor – até que, 250 anos mais tarde, o primeiro “fogo estranho” surgiu, tentando criticar e desmerecer o real valor dessa obra magnífica e eterna: surgiu um clamor dos críticos por “Revisão” e publicou-se a edição “Revised Standard Version / Versão Padrão Revisada” e, desde então, dezenas de novas traduções, adaptações, versões e edições em linguagens modernas e atuais surgiram, muitas dessas – com o apoio financeiro e político do sistema papal católico romano – tais edições poderiam ser consideradas “Unauthorized Versions / Versões não Autorizadas ou Espúrias”.

Infelizmente, profissionais das novas ciências da economia, da comercialização e do consumo, como o “mau marketing” descobriram na publicação da Bíblia um excelente “negócio” e resolveram lotar as gôndolas dos supermercados com belas capas e pobre conteúdo. Há empresas que nem se preocupam com as belas capas e o bom acabamento da obra, e imprimem, versões incompletas e em linguagem descuidada, sobre o pior e mais barato papel, a Palavra que Deus escreveu com sangue ao longo de séculos e milênios, como a Sua Carta Pessoal à Humanidade.

King James foi um homem que enfrentou com fé suas próprias lutas e dores.

Ainda que James (Tiago) I tenha vivido uma vida de muitas e magníficas realizações, fora um homem familiarizado com o sofrimento em suas diversas modalidades e expressões. Sofreu com necessidades especiais em suas pernas; tinha dificuldade para pronunciar as palavras com clareza, ainda que fosse um homem extremamente culto e poliglota. Como resultado de sua pouca força nas pernas e instabilidade para andar, tinha quedas comuns, e muitos machucados pelo corpo, além de sofrer com a humilhação e a zombaria dos inimigos que se aproveitavam dessas fraquezas para criticá-lo. James ainda lutou contra várias outras enfermidades, como artrite, cólicas abdominais, gota, insônia, espasmos e fraqueza, náuseas, diarreias, e horríveis dores renais. Muitos pesquisadores e biógrafos acreditam que os vários males de saúde de James eram congênitos e produzidos pelo sistema nervoso.

Além desses martírios físicos, o rei padecia de depressão, motivada, principalmente, pela maneira como perdeu os pais e sua amada esposa, Queen Anne, ocorrida em 1619, e que fora precedida pela morte de seu filho mais velho, Prince Henry, em 1612. King James foi um homem que conheceu a dor e o sofrimento em suas várias dimensões e soube usar sua própria dor para se compadecer do próximo ao mesmo tempo em que se tornou um valoroso encorajador. O pôr do sol da vida do rei James VI e I ocorreu no dia 27 de março de 1625 em Theobolds Park na cidade de Herts, Inglaterra. Morreu aos 58 anos de idade e foi sepultado na abadia de Westminster. Diferentemente de muitos monarcas escoceses, King James morreu em sua própria cama, em paz, tendo o carinho de seus súditos e de muitos líderes estrangeiros. Transferiu seu reinado – sem máculas – para seu filho adulto, o que também não era comum entre os monarcas do Reino Unido naqueles tempos.

Após mais de 400 anos de existência e frequentes aperfeiçoamentos, como os implementados na nova tradução atualizada para a língua portuguesa, realizada com maestria e total dedicação pelo Comitê Internacional de Tradução da Sociedade Bíblica Ibero-Americana e editora Abba Press, a Bíblia King James mantém sua trajetória de sucesso e a preferência dos leitores em todo o mundo, e, agora, pelos leitores de língua portuguesa, conduzindo diariamente milhares de pessoas, crianças, jovens, adultos e idosos, ao conhecimento de Jesus Cristo como único e poderoso Salvador de suas vidas, aqui, na terra e em nosso tempo, e por toda a eternidade na Nova Jerusalém (Ap 21 KJA).